Você não se sente criativo?

Beatriz Milhazes - O Mágico, 2001

Beatriz Milhazes - O Mágico, 2001

Esta semana tive o prazer de reencontrar um velho amigo, o Alexandre, que conheci em 2010 quando coordenava o Centro de Empreendedorismo do Insper. Na época ele trabalhava em uma grande multinacional americana e, juntos, lançamos o Innovation Challenge Brasil, a principal competição de inovação corporativa entre MBAs no Brasil.

A competição proporcionava aos competidores, todos alunos das melhores escolas do pais, uma oportunidade única para demonstrar sua capacidade de criar soluções inovadoras para desafios reais apresentados por grandes corporações, como a do meu amigo.

Em nosso reencontro voltamos a falar sobre a competição e ele me confessou que ficou decepcionado com a qualidade das ideias apresentadas. Foram mais de 50 equipes de instituições de MBA de todo o país trazendo suas ideias para resolver o problema da empresa.

O Alexandre coordenava a equipe que selecionou os finalistas e tinha grandes expectativas sobre as ideias. Em um processo em que os competidores tiveram acesso aos dados da empresa, puderam entrevistar alguns executivos e até mesmo conhecer a planta da principal unidade fabril, era de se esperar que suas ideias fossem de ruptura. Não foi o que aconteceu.

Muito a contragosto, sou obrigado a concordar com Alexandre, pelo menos as ideias que vi eram muito cheias de clichês, frases prontas, soluções já existentes, fantasiosas demais ou mais do mesmo, nada realmente inovador. Os cursos de MBA em geral, lamentavelmente não estavam sendo bem sucedidos em desenvolver competências criativas nos alunos.

Hoje é difícil encontrar alguma empresa que não esteja preocupada em melhorar sua competitividade através da inovação, seja em produtos, processos ou negócios. Em alguns setores, inovar significa, mais do que um diferencial, uma questão de sobrevivência.

Iniciativas como o Innovation Challenge se tornam relevantes na medida em que empresas vêem nesse canal uma forma de conseguir ideias diferentes e novos enfoques para seus negócios. Além, é claro, da possibilidade de descobrir novos talentos.

Sendo esta uma necessidade evidente do mercado, faço a seguir algumas considerações sobre os motivos que levam as pessoas a perder sua capacidade criativa:

1. Excesso de informação:

Até pouco tempo atrás, sofríamos com a carência de informações. O advento da internet mudou isso de uma forma avassaladora. Agora, ao contrário, somos atolados por newsletters, blogs, twitters, email marketing, boletins, rss feeds, de todo e qualquer tipo. O futurólogo americano Alvin Toffler, prevendo os vieses da recém constituída sociedade do conhecimento advertiu: 'uma das competências mais valorizadas no futuro não será a capacidade de aprender, e sim a capacidade de desaprender para aprender o novo';. Quando todos estamos expostos às mesmas fontes de informação perdemos a capacidade de pensar diferente dos demais, acabamos adotando uma linha de pensamento padronizada que é extremamente prejudicial para a geração de ideias diferentes.

2. A prisão dos paradigmas:

Ao longo da nossa vida aprendemos o jeito certo de se fazer as coisas, nossos paradigmas – os padrões que dão segurança e previsibilidade a tudo o que fazemos na vida. Estes padrões são necessários para que as pessoas encontrem referências para adequar seu comportamento de forma que seja socialmente aceita, porém, quando passamos a acreditar que este padrão é o único jeito de fazer as coisas, passa a ser algo péssimo para o pensamento criativo. É por causa desta prisão, desta paralisia, destes bloqueios mentais, que ficamos presos a respostas pré-determinadas, limitando nossa capacidade de vislumbrar novos caminhos, novas alternativas, novos padrões. Uma das coisas que reparei na minha experiência acadêmica é que  os jovens são naturalmente mais criativos do que os executivos e que as crianças são mais criativas do que os jovens. Existe uma relação invertida entre formação educacional e criatividade. Quanto mais aprendemos, mais paradigmas criamos e isso nos leva a gerar ideias que estejam dentro de um escopo de realidade limitado pelos nossos paradigmas. A expressão ‘pensar fora da caixa’ significa exatamente a capacidade de sair da prisão dos paradigmas para buscar alternativas regidas por outros paradigmas que não temos. Mas a frase que mais gosto sobre isso é atribuída a Jean Cocteau ‘Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez’.

3. Universo de realidade limitado e restrito:

Repare bem, as pessoas mais criativas que você conhece são justamente aquelas que acumularam mais experiências, aprenderam muitas coisas diferentes, mudaram algumas vezes de emprego, desfrutam de uma variada rede de relacionamentos. Isso não é por acaso. Quanto mais diversos são os estímulos que recebemos, maior é a capacidade de ‘conectar pontos’ que vão levar a ideias realmente inovadoras. A capacidade de criar é diretamente proporcional à diversidade do nosso repertório mental.

4. A pressão do tempo:

‘Não tenho tempo!’ é uma das expressões mais comuns que encontramos nos centros urbanos. As pressões vêm de todos os lugares, de todas as formas e com várias intensidades e origens. Nada pode ser mais prejudicial à capacidade criativa do que a falta de tempo e espaço para relaxar, desligar-se dos desafios e das situações e permitir que os pensamentos vaguem livremente, sem amarras racionais e conscientes. Esta é a ideia de Domenico de Masi (O ócio criativo), que postula o desprendimento do problema como forma de encontrar soluções criativas. Ou será que você nunca teve uma ideia brilhante no meio da madrugada ou tomando uma chuveirada?

5. Medo de errar:

Desde criancinhas aprendemos que o erro é penalizado, que devemos acertar sempre. No mundo empresarial a postura ‘fazer certo sempre’ e ‘erro zero’ é mais ainda mais enfatizada. Não existe inovação sem algum grau de tolerância ao erro. Tentativas frustradas fazem parte do processo de desenvolvimento. Muitas boas ideias só surgem depois de várias más ideias. Por causa disso, acabamos por desenvolver uma cultura de autocrítica muito forte que nos faz podar nossas próprias ideias nascentes simplesmente porque podem não ser bem vistas, podem nos ridicularizar, nos expor demais ou nos prejudicar de alguma forma.

Muito bem, vamos parar por aqui. Quantas escolas exploram técnicas de criatividade? Quantos MBAs desenvolvem ativamente esta competência? Quantos cursos oferecem oportunidades para ampliar horizontes, aceitar o erro, permitir o ócio, quebrar paradigmas e limpar a mente? Eu não conheço nenhum entre os MBAs, mas conheço algumas escolas livres como a Polifonia.

Enquanto o ensino superior não repensar seus cursos para preparar os alunos nesta competência são estas escolas livres que vão atender esta tão urgente demanda do mundo.

Por Marcos Hashimoto

Co-fundador da Polifonia e Professor de Empreendedorismo na Universidade de Indianapolis - EUA, consultor de negócios e especialista em inovação corporativa.

Polifonia